Da Folha de S. Paulo
O
empresário Joesley Batista, sócio do grupo J&F, disse que o
ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) era "o mensageiro" do
presidente Michel Temer, responsável por informá-lo sobre a situação de
supostos pagamentos feitos para silenciar o ex-deputado Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) e o doleiro Lúcio Bolonha Funaro, ambos presos desde o ano
passado pela Lava Jato.
A informação faz parte da entrevista que Joesley concedeu à revista "Época", divulgada nessa sexta (16).
O ex-ministro, segundo Joesley, mantinha contato quinzenal com ele para saber sobre os repasses.
"E toda hora o mensageiro do presidente me procurando para garantir que eu estava mantendo esse sistema", disse o empresário.
"Geddel
[era o mensageiro]. De 15 em 15 dias era uma agonia terrível. Sempre
querendo saber se estava tudo certo, se ia ter delação, se eu estava
cuidando dos dois. O presidente estava preocupado. Quem estava incumbido
de manter Eduardo e Lúcio calmos era eu", declarou.
Joesley
disse não ter dúvidas de que Temer estava consciente do esquema. "Sem
dúvida [Temer sabia dos pagamentos]. Depois que o Eduardo foi preso,
mantive a interlocução desses assuntos via Geddel. O presidente sabia de
tudo", disse.
"Eu
informava o presidente por meio do Geddel. E ele sabia que eu estava
pagando o Lúcio e o Eduardo. Quando o Geddel caiu, deixei de ter
interlocução com o Planalto por um tempo. Até por precaução."
O
empresário disse que Temer tinha ascendência sobre Cunha e o acusou de
chefiar uma organização criminosa. "A pessoa à qual o Eduardo se referia
como seu superior hierárquico sempre foi o Temer", disse o empresário,
na entrevista.
"O
Temer é o chefe da Orcrim [sigla para organização criminosa] da Câmara.
Temer, Eduardo, Geddel, Henrique [Alves], [Eliseu] Padilha e Moreira
[Franco]. É o grupo deles. Quem não está preso está hoje no Planalto.
Essa turma é muita perigosa. Não pode brigar com eles", prosseguiu o
empresário.
Joesley
afirmou que recebia pedidos do presidente. "O Temer não tem muita
cerimônia para tratar desse assunto. Não é um cara cerimonioso com
dinheiro", disse. "Acho que ele me via como um empresário que poderia
financiar as campanhas dele -e fazer esquemas que renderiam propina."
O
empresário citou um caso específico na entrevista. "Teve uma vez também
que ele me pediu para ver se eu pagava o aluguel do escritório dele na
praça [Panamericana, em São Paulo]", disse.
Joesley diz que na ocasião se fez de desentendido e não atendeu à solicitação.
Joesley
afirmou que recebia pedidos de dinheiro de Cunha e Funaro vinculados a
vários assuntos e citou como exemplo uma solicitação de Cunha de R$ 5
milhões para evitar a abertura de uma CPI que atingiria a JBS. Na
ocasião, o empresário disse que não pagou.
Os pedidos de propina, segundo ele, continuaram mesmo depois da prisão do ex-deputado.
ACORDO POLÊMICO
Joesley
Batista assinou um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral
da República, que foi homologado pelo ministro do STF (Supremo Tribunal
Federal) Edson Fachin, relator da Lava Jato no tribunal.
O
acordo recebeu críticas por conta dos benefícios concedidos ao
empresário, que não cumprirá pena nem mesmo será processado. Ele e a
família tiveram autorização para viajar aos EUA em jatinho da empresa.
A
JBS, frigorífico do grupo J&F, está sendo investigada pela CVM
(Comissão de Valores Mobiliários) em cinco processos administrativos
para apurar supostas irregularidades, como o uso de informações
privilegiadas em negociações de dólar futuro e ações.
Na
entrevista, o empresário diz que não manipulou o mercado: "A CVM pode
investigar e temos tranquilidade em responder. São operações feitas
absolutamente dentro das regras", declarou.
Ele
também afirmou que se viu forçado a gravar Temer para provar que estava
sofrendo achaques, e refutou que o áudio tenha sido alterado. "Zero.
Zero. Gravamos e entregamos. Podem fazer todas as perícias do mundo",
afirmou.
PT E PSDB
Na
entrevista, Joesley também faz acusações ao PT, que, segundo ele,
inaugurou o esquema que perdurou sob Temer. Seu interlocutor para o
pagamento de propina seria o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.
"Quando
era efetivado o negócio, saía uma parcela, eu creditava o valor da
propina na conta do Guido na Suíça", declarou. A diferença, segundo ele,
era que a abordagem do PT era "menos agressiva".
Ele poupa o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, afirmando que nunca teve conversa "não republicana" com o petista.
Explica também por que gravou o senador Aécio Neves (PSDB-MG), hoje afastado do cargo por decisão do Supremo.
Aécio,
segundo ele, era a alternativa de poder. "Teve 48% dos votos dos
brasileiros [na eleição de 2014]. E tinha entrado no governo do Temer",
afirmou.
O
empresário declarou ainda que não tem mais revelações a fazer e que
prestaria depoimento a uma CPI para investigar suas acusações.
Nenhum dos citados por Joesley na entrevista quis se manifestar até o momento.