Capitão da extrema direita vai mal no Nordeste, mas causa mais curiosidade que outros candidatos
Vinicius Torres Freire - Folha de S.Paulo
Com ou sem Lula na disputa, é no Nordeste que Jair Bolsonaro marca seu pior desempenho nas paradas de sucesso eleitoral, uns 8%, segundo o Datafolha do fim de janeiro, o mais recente. Na prática, empata com Geraldo Alckmin. Lula leva cerca de 60% dos votos nordestinos.
Em Garanhuns, terra de Lula, que lhe deu 90% dos votos no segundo turno de 2006, o povo nas ruas reage com um franzir de olhos, uma expressão turva de desconhecimento, ao ouvir o nome de Alckmin. Na pesquisa espontânea do Datafolha, o tucano paulista não chega a 1% das menções dos eleitores nordestinos. Bolsonaro é outra história, mesmo pouco votado.
O capitão da extrema direita era citado em quase metade dos discursos da manifestação de repúdio à prisão de Lula, na tarde de sexta-feira (6), aqui em Garanhuns. Um homem cruel, violento. Que não
fala do povo pobre, que desrespeita as mulheres e os seres humanos em geral. Uma desgraça que não deveria levar o voto nordestino.
Os oradores eram do PT e sindicalistas rurais, gente de prefeituras da região, de movimentos sociais e estudantis. Falavam mal da “mídia”, do Supremo, do “governo usurpador” de Michel Temer, instrumentos da elite odienta. Mas Bolsonaro não entrava nesse balaio.
Esses militantes não têm lá muita relevância política. Lula é rei em Garanhuns e entorno, mas o PT jamais elegeu prefeito aqui e não tem vereadores. O prefeito da cidade é do PTB, e seu líder na Câmara é um
vereador do PC do B, que por sua vez negocia apoio a Marília Arraes (PT) na campanha pelo governo estadual.
Entre essa esquerda municipal e entre o povo das ruas, porém, Bolsonaro suscita interesse. Políticos locais dizem que o grupo de apoio do capitão é “mínimo”, mas colocou um outdoor de campanha nos arredores da cidade, como tantos que aparecem pelos interiores rurais do Brasil.
Diante das questões deste jornalista sobre Bolsonaro, o povo não raro devolve a pergunta, curioso e desconfiado: “Você acha que ele pode ganhar?”. Afora no caso de Lula e, um tanto, de Ciro Gomes (PDT), os demais candidatos causam indiferença, desprezo tranquilo.
Garanhuns é uma cidade comercial. Caetés, seu distrito elevado a município em 1963, onde Lula nasceu, uma terra de pequenos agricultores muito pobres. Nas duas, porém, Previdência Rural e Bolsa Família pesam tanto na renda que o comércio gira com força entre os dias 30 e 10, quando são pagos os benefícios, dizem os locais. Não é surpresa, assim como a ojeriza, se não raiva, quando se fala de reforma da Previdência.
As pessoas perguntam se “esse Bolsonaro”, assim como Michel Temer, também quer acabar com o salário mínimo e a Previdência, objetos de respeito tão grande quanto as realizações do governo Lula para o povo das ruas daqui. São assuntos de vida e morte, de vida ou miséria, que causam emoção e indignação, intensas como essas raivas epidérmicas de redes insociáveis, mas encarnadas, profundas, o que é evidente em gestos, tom de voz e expressões da gente comum que discute esses temas.
Bolsonaro não perturba assim os humores, mas parece intrigar essas pessoas que não votam nele, tido como alguém à parte do mundo da política conhecida. Não leva os votos daqui, mas se tornou um assunto.