Lula
está com ideias. Começam a aparecer na conversa do ex-presidente uns
fragmentos de programa de governo, rascunhos de planos de economistas,
parece. Os cacos dos projetos ficaram mais evidentes na entrevista
coletiva da semana passada.
O que merece atenção?
Lula
promete reforma tributária progressista, a que seu governo não fez.
Isto é, cobrar mais impostos de ricos, tributar grandes heranças e
aplicações financeiras.
Lula
acha que a crescente dívida do governo não é empecilho a endividamento
extra (governos de países ricos têm dívidas maiores do que o nosso,
argumenta): "Se eu elaborar uma política econômica e estou sem dinheiro
para fazer investimento, tenho capacidade de me endividar...".
Porém
básico: as taxas de juros cobradas de governos ricos são zero ou menos
do que isso desde 2008. No Brasil, ainda estão em nível que nos levará à
falência. Com mais dívida, subiriam ainda mais.
Lula
acha que pode recorrer a outros meios de financiar o investimento
público: "...posso utilizar o compulsório, usar parte do dinheiro das
reservas ["poupança em dólar", guardada no BC para evitar ou resolver
crise de financiamento externo]".
"Compulsório"
é o dinheiro que os bancos são obrigados a deixar parado no Banco
Central. Mas o governo não é dono desses fundos, não pode mexer nisso.
Se Lula pensa na verdade em desobrigar os bancos de deixar tanto
dinheiro no BC, não tem muito como direcioná-lo para empréstimos, menos
ainda para investimento público.
Tentar
usar reservas em escala maciça teria efeitos colaterais graves o
bastante para contrabalançar algum efeito positivo, para dizer o menos.
Lula quer voltar a recorrer a bancos estatais a fim de investir e induzir investimentos privados.
Tal
política ganhou força no governo Lula 2. Tornou-se desastre ruinoso sob
Dilma Rousseff. Serviu para criar oligopólios e conglomerados,
financiados e apadrinhados pelo Estado. A esse respeito, escrevia-se o
seguinte nestas colunas, em janeiro de 2009:
"A
atuação das estatais na reorganização do controle da grande empresa
[privada] é um dos aspectos mais relevantes do governo Lula. Os negócios
merecem instância ou comissão especial do Congresso para
acompanhá-los... Sabemos muito pouco da transferência de renda, direta e
indireta, propiciada pelo patronato estatal de fusões & aquisições.
Não sabemos se o Estado impulsiona investimentos ou apenas os
subsidia".
Lula
também parece acreditar que a conta do deficit da Previdência está
errada: a Constituição previa recursos bastantes, alega, mas o dinheiro
previdenciário teria sido como "desviado", passando a fazer parte de
modo indevido do bolo total do Orçamento. É o mesmo argumento de certa
esquerda.
Se
não há deficit previdenciário, o ex-presidente teria de arrochar ou dar
cabo do restante do gasto público (pois o resto do governo teria de
"devolver" o dinheiro para a Previdência). O deficit previdenciário
equivale a quase tudo que se gasta em saúde, educação, Bolsa Família e
PAC, por exemplo.
Se
Lula não vai fechar o resto do governo, precisa elevar impostos em
quase 3% do PIB (uns R$ 184 bilhões) para cobrir a conta da Previdência
(hoje. Em 2019, será pior).