Josias de Souza
A presença de líderes de facções políticas na cadeia deflagrou um movimento com potencial para revolucionar o sistema prisional brasileiro. Os sinais mais eloquentes são percebidos no Rio de Janeiro. Cérebro do Primeiro Comando do PMDB, Sérgio Cabral dedica-se a um projeto-piloto de introdução da cozinha gourmet no xadrez. Cabeça da Facção Molequinha, Anthony Garotinho inaugurou, por assim dizer, um núcleo teatral que pode ser o embrião de um programa de ressocialização de presos viciados em cinismo.
Gilmar Mendes foi premonitório ao revogar a transferência de Cabral. Se o ex-governador tivesse migrado para o presídio federal do Mato Grosso, como queria o juiz Marcelo Bretas, o Ministério Público do Rio não teria flagrado na última sexta-feira a notável evolução no cardápio da cadeia carioca de Benfica.
Cabral e seus comparsas do bando pemedebista evoluíram das velhas quentinhas para novos pratos, ingredientes e iguarias que denunciam a qualificação do paladar da população carcerária: camarão, bacalhau, queijo de cabra, presunto de parma, castanhas, iogurtes… Pode-se prever, para um futuro próximo, a introdução no presídio de uma boa carta de vinhos.
Acomodado numa ala vazia de Benfica, Garotinho aproveitou a solidão para esboçar um script fabuloso. Nele, um desconhecido invade sua cela de madrugada, critica-o por falar demais, golpeia seu joelho com um porrete, esmaga-lhe um par de dedos do pé, balbucia uma ameaça e evapora. Não vai render o Oscar de melhor roteiro original, pois as câmeras do circuito interno não captaram a ação. Mas, com pequenos ajustes, a peça pode ser encenada por presos-atores de todo país. Transferido para Bangui 8, o próprio Garotinho pode iniciar a difusão de sua arte.