"Alguma coisa como República da Casa de Noca"
Rudolfo Lago – Blog Os Divergentes
Num
tweet publicado por volta das 9h da manhã, o presidente Michel Temer
chamou o Ministério Público e todos os demais responsáveis pela segunda
denúncia contra ele de “associação criminosa”. Na verdade, Temer
devolve, em 140 toques, aquilo que o ex-procurador geral da República
Rodrigo Janot imputou contra ele e os ministros da Casa Civil, Eliseu
Padilha, e da Secretaria Geral da Presidência, Moreira Franco. Nas mais
de 200 páginas da ação, Janot diz que Temer e seus dois ministros
compõem uma “organização criminosa”.
O
tweet fazia parte de um conjunto de comentários no qual o presidente
justificava as diversas conversas que teria ao longo do dia com
deputados para garantir que a segunda ação, da mesma forma como
aconteceu com a primeira, seja barrada na Câmara. “Precisamos lidar com
mais uma denúncia inepta e sem sentido proposta por uma associação
criminosa que quer parar o País”.
Eis
aí o grande problema. A partir do momento em que atingiu poderosos nos
primeiros escalões dos poderes da República, a Operação Lava-Jato e seus
similares começou a gerar uma incômoda desarmonia na República. A ideia
da necessidade de harmonia entre os poderes da República é uma das
bases da construção da democracia. Já está em Montesquieu no seu
“Espírito das Leis”. As ações do Executivo, Legislativo e Judiciário
devem ser autônomas e complementares. E cada um desses poderes fiscaliza
o outro. A Constituição de 1988 incluiu nesse angu o Ministério
Público, um organismo independente dos outros três capaz de
investigá-los, em nome da sociedade. Tal fiscalização exercida por um
poder sobre o outro forma o que é chamado de sistema de pesos e
contrapesos: um poder impede que o outro extrapole. Hoje, porém, as
ações de um poder têm sido duramente contestadas por outro, se isso
provoca grande incômodo. Sob o risco mesmo de serem desobedecidas. O que
é um grande perigo.
Por
um lado, alguns argumentam que a vaidade pode ter subido à cabeça dos
que atuam no Ministério Público e no Judiciário. Poder demais exercido
de uma maneira política inconveniente. Espetáculos de pirotecnia muitas
vezes em lugar de apurações sérias. Discussões e trocas de ofensas que
não caberiam nas Altas Cortes. O caso do suicídio do reitor da
Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancelier de Olivo, é
um fato que não pode ser ignorado. Até onde se pode e se deve expor uma
pessoa à execração em nome da moralidade pública?
No
caso dos políticos investigados, todos eles alegam perseguição e
inocência. A alguns, as torcidas do nosso FlaXFlu insano concedem o
benefício do crédito. A outros não, dependendo do time para o qual se
torça.
Ao
chegar, porém, ao topo dos demais poderes, seus ocupantes passam a
exercer também a força que possuem. Como na questão do Senado com Aécio
Neves, já comentada por aqui.
Mais
do que determinar quem extrapola, por que extrapola, como extrapola,
com qual finalidade extrapola, o que coloca em risco essa nossa frágil
democracia é quando a argumentação dessa extrapolação compromete a
harmonia entre os poderes e seus papeis. Uma democracia na qual seus
poderes não se respeitam teria de ser rebatizada para alguma coisa como
“República da Casa de Noca”…