Janio de Freitas – Folha de S.Paulo
Nem
Michel Temer ficou livre do risco de destituição, nem esse risco
depende da Procuradoria-Geral da República recém-reformada, e ainda
cinzenta sobre acusações criminais que ele e seus controlados na Câmara
não desmontaram. Há quase meio ano, um pedido de impeachment de Temer, com a chancela da OAB, aguarda a definição do seu destino, entre a apreciação e o arquivamento.
Por
um dos muitos erros de procedimentos institucionais, essa definição
está a cargo de uma só pessoa, o presidente da Câmara. Para Eduardo
Cunha, no caso de Dilma Rousseff, foi fácil a decisão: bastou a recusa
da presidente à chantagem de acionar o PT para defendê-lo da
destituição, ou daria andamento ao impeachment presidencial. Para
Rodrigo Maia, a decisão é um problema funcional e uma encruzilhada política.
O
desempenho de Maia tem surpreendido mesmo entre seus colegas. Até
agora, manteve-se com rigor, e sem espalhafato midiático, nos limites da
Constituição, do Regimento da Câmara e do uso da autoridade. Cresceu
muito como político, um salto da zona sombria para o nível pouco
habitado das vozes procuradas –nem todas por boas qualidades.
Os
meses em que Maia retém a iniciativa da OAB coincidem com a
conveniência de não sobrepor, por seu efeito tumultuoso, duas ações
contra Temer, sendo a outra a da Procuradoria-Geral da República. Esta,
porém, foi vencida. E Rodrigo Maia deve a decisão pendente.
Quem está em jogo nessa decisão é o político agora honrado com a classificação de governante mais rejeitado do mundo. E olha que a consultoria internacional Eurasia deu a Temer 7% de aprovação,
explicados como índice obtido na pesquisa CNI/Ibope. Nesta, porém, a
aprovação de Temer está em 3%, e no Datafolha em 5%. Mesmo com o índice
caridoso, Temer está longe dos 18% de aprovação do segundo pior, Jacob
Zuma, da África do Sul. Nicolás Maduro, com 23%, tem mais de três vezes a
aprovação de Temer.
Um
governante com 3% ou 5% de aceitação tem, na prática, a unanimidade do
país contra sua presença no cargo que não usa. Ou só usa em seu
proveito, seja para atividades que o põem sob acusações de crimes de
corrupção e formação de quadrilha. Seja para a imoralidade criminosa com
que usa cargos e verbas públicas na compra de deputados que protelem os
processos criminais. Operação em que foi exposta uma falta de
escrúpulos como jamais vista em governos deste tão pouco servidos de
escrúpulos.
Por
duas vezes, ao custo de dezenas de bilhões do dinheiro público, Temer
reteve na Câmara a ação que o retiraria da Presidência. O que fará, na
terceira ocasião ameaçadora, para que Rodrigo Maia reproduza o que antes
coube ao plenário de metade comprada? E o que fará Rodrigo Maia com um
governante nas condições policiais, judiciais, imorais e repelido
nacionalmente como Temer?
O
pretexto das reformas, em favor de Temer, está eliminado pelo próprio
Rodrigo Maia e por Eunício Oliveira: os presidentes da Câmara e do
Senado reiteraram com ênfase, ao final da semana, não haver condições
para que o Congresso venha a aprovar reformas. Além de mais um
desmentido ao que estão dizendo Temer e Henrique Meirelles, que anuncia
aprovações dentro de uns 30 dias, os dois presidentes declaram a plena
inutilidade de Michel Temer mesmo para os que o amparam por esperança em
reformas.
No
jogo a ser decidido pelo presidente da Câmara há mais do que Michel
Temer. Há também a imagem feita por Rodrigo Maia, com o desempenho na
crise, e sua relação com o povo que pede "Fora Temer!".