Elio Gaspari, O Globo
O
país tornou-se conhecido pelos escândalos envolvendo as relações do
governo e seus amigos com empreiteiros, petrogatunos e exportadores
Lula
disse na Colômbia que sente “um cheiro de retrocesso político na
América Latina e na América do Sul” e pediu à plateia que não
acreditasse “nas bobagens da imprensa”. Nosso Guia tinha ao seu lado o
ex-presidente do Uruguai José Mujica.
Falta explicar o que Lula considera “bobagens da imprensa”.
Certamente
não são as notícias sobre a honorabilidade de Pepe Mujica, um
ex-guerrilheiro que presidiu seu país de 2010 até março passado e elegeu
seu sucessor. Ele não teve mensalón, nem petrolón. Continuou morando na
mesma casa, com o mesmo carro e a mesma cachorra Manuela.
Ao
assumir, anunciou que doaria 70% de seu salário para a construção de
casas para os pobres. Segundo a Transparência Internacional, o Uruguai,
junto com o Chile, têm os menores índices de corrupção da América
Latina.
Talvez
Lula esteja falando das “bobagens da imprensa” em relação à Argentina,
que vai eleger seu novo presidente no dia 22. Lá, 14 anos de domínio do
casal Néstor e Cristina Kirchner levaram a economia para o buraco, e a
família da presidente, para a fortuna.
O
país tornou-se conhecido pelos escândalos envolvendo as relações do
governo e seus amigos com empreiteiros, petrogatunos e exportadores.
Uma
banda da esquerda latino-americana acumula duas marcas sinistras. Tem a
mais longeva das ditadura em Cuba e os dois países mais corruptos do
continente: a Venezuela narcobolivariana, seguida pela Nicarágua
sandinista da família Ortega. Bolívia, Equador e Argentina têm índices
de corrupção piores que o Brasil.
O
que há por aí não é um cheiro de retrocesso político, mas a verificação
de que existem países assolados pela corrupção e governos que se dizem
de esquerda. O Chile e o Uruguai estão na outra ponta.
Bolivarianos,
sandinistas e petistas chegaram ao poder com a bandeira da moralidade. O
que há no ar não é um cheiro de retrocesso político, mas de repúdio aos
pixulecos.
Roubalheira
não tem ideologia. O general Augusto Pinochet tinha o apoio de grande
parte da população chilena enquanto torturava e matava opositores.
Quando se descobriu que ele e sua família tinham US$ 15 milhões em 125
contas secretas, a direita chilena jogou sua memória no mar.
Quando
o filho da presidente chilena Michelle Bachelet foi apanhado em
traficâncias, ela demitiu-o e disse que enfrentava “momentos difíceis e
dolorosos como mãe e presidente”. Não culpou a elite nem viu
conspiração, muito menos “retrocesso político”. Viu apenas realidade:
seu filho metera-se numa roubalheira.