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Ao
arrostar a primeira de uma série de condenações judiciais, Eduardo
Cunha acentuou o seu drama. Com o poder estilhaçado, o exczar da Câmara
já tinha perdido a vergonha na face, o recato, a infantaria parlamentar
e a pose de vítima. Com uma sentença de 15 anos e 4 meses a pesar-lhe
sobre os ombros, Cunha começa a perder também as esperanças de recuperar
a sanidade mental. Ao chamar Sergio Moro de “justiceiro político” e
apresentar-se como “troféu” do juiz da Lava Jato, Cunha aperta o nó da
corda que traz no pescoço.
Cunha caiu do pedestal sozinho. Não precisou de ajuda de rivais.
Eleito presidente da Câmara, prestou depoimento espontâneo numa CPI.
Inquirido, atirou conta o próprio pé a mentira de que jamais teve contas
no exterior. Pilhado com dinheiro escondido na Suíça, saiu-se com a
piada do “truste”. Desmascarado, adotou a chantagem como tática
política. Apressou o impeachment de Dilma sem se dar conta de que,
depois dela, seria a bola da vez.
Antes de morrer, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal
Federal, envernizou sua biografia ao empurrar Cunha para fora da
poltrona de presidente da Câmara e do mandato parlamentar. Suspenso, o
bicho-papão foi perdendo a capacidade de assustar. Virou um aliado
tóxico. Após uma embromação de nove meses, os soldados de sua milícia
parlamentar ajudaram a passar-lhe o mandato na lâmina.
Enviado a Curitiba, Cunha revelou-se capaz de tudo, menos de
refletir. Diferentemente de personagens análogos, como o correligionário
Renan Calheiros, Cunha age dez vezes antes de pensar. Mesmo
trancafiado, anotou Sergio Moro na sentença, o réu tramou “alguma
espécie de intervenção indevida” do exparceiro Michel Temer em seu
socorro. Endereçou perguntas constrangedoras ao presidente, impregnadas
de segundas intenções.
O comportamento de Cunha, escreveu o juiz, ''apenas revela que sequer
a prisão preventiva foi suficiente para fazê-lo abandonar o modus
operandi de extorsão, ameaça e chantagem''. Indefeso, Cunha costuma
ficar fora de si. E mostra com mais nitidez o oco que tem por dentro:
''Esse juiz não tem condição de julgar qualquer ação contra mim, pela
sua parcialidade e motivação política'', escreveu.
Com o vazio a subir-lhe à cabeça, Cunha anuncia: ''É óbvio que irei
recorrer, e essa decisão não se manterá nos tribunais superiores, até
porque contém nulidades insuperáveis.'' Alguém precisa avisar que será
necessário levar à balança do TRF4, sediado em Porto Alegre, algo mais
consistente do que o lerolero habitual.
Desnecessário lembrar que uma confirmação da sentença de Moro na
segunda instância transformará a cadeia de Cunha de temporária em
perene. Nos seus áureos tempos, Cunha gostava de se comparar com o
carcará, aquele pássaro que pega, mata e come. Hoje, o personagem mais
parece um pardal de si mesmo. Esforça-se para sujar a testa da estátua
de bronze que imagina merecer.