O
ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki afastou o
presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do mandato de deputado
federal e, consequentemente, do comando da Casa hoje.
A decisão do ministro atende a um pedido do procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, feito em dezembro do ano passado, que alega
que Cunha usou o cargo para interferir nas investigações da Operação
Lava Jato, da qual é alvo.
No pedido, o procurador aponta 11 fatos que comprovariam que Cunha
usa seu mandato de deputado e o cargo de presidente da Câmara para
constranger e intimidar parlamentares, réus colaboradores, advogados e
agentes públicos, com o objetivo de embaraçar e retardar investigações
contra si.
As manobras de aliados no Conselho de Ética para retardar o processo
contra o deputado também foram citadas pela Procuradoria. Na época,
Cunha afirma que o pedido é uma "cortina de fumaça" para desviar o foco
do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT).
Veja abaixo quais são os pontos elencados por Janot contra Cunha:
1. Requerimentos para pressionar por propina
Segundo a Procuradoria, dois requerimentos pedindo informações ao TCU
(Tribunal de Contas da União) e ao Ministério de Minas e Energia sobre a
empresa Mitsui tinham na verdade o objetivo de pressionar o lobista
Júlio Camargo pelo pagamento de propina ligada a contratos com a
Petrobras. Os requerimentos foram apresentados pela então deputada
Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada de Cunha, mas, segundo a PGR, o
registro no sistema de informática da Câmara mostram que o verdadeiro
autor foi Cunha.
2. Requerimentos contra o grupo Schahin
A ação da Procuradoria afirma que Cunha patrocinou uma "perseguição"
ao grupo empresarial Schahin, que tinha interesses conflitantes aos de
aliados do deputado na hidrelétrica de Apertadinho, em Rondônia. Aliados
de Cunha teriam, segundo a Procuradoria, apresentado 32 requerimentos
com pedidos de informação e convocação de depoimentos em comissões da
Câmara contra o grupo Schahin.
3. Convocação pela CPI da advogada Beatriz Catta Preta
Mantendo aliados em "postos-chave" da CPI (Comissão Parlamentar de
Inquérito) da Petrobras, segundo a Procuradoria, Cunha conseguiu a
convocação pela comissão da advogada Beatriz Catta Preta, responsável
por diversos acordos de delação premiada na Operação Lava Jato. A
convocação foi aprovada após um dos delatores assistidos pela advogada, o
lobista Júlio Camargo, ter implicado Cunha no recebimento de US$ 5
milhões em propina desviada de contratos de navios-sonda da Petrobras.
Segundo a Procuradoria, a convocação da advogada teve o objetivo de
intimidá-la.
Em entrevista ao "Jornal Nacional" em julho, Catta Preta disse que
Júlio Camargo tinha "medo de chegar" ao presidente da Câmara em suas
delações. Ela afirmou que deixou a profissão após receber "ameaças
veladas" de integrantes da CPI.
4. Contratação da consultoria Kroll pela CPI da Petrobras
A contratação da empresa de investigação financeira Kroll pela CPI da
Petrobras foi vista pela Procuradoria como uma estratégia de Cunha para
tentar anular as delações da Operação Lava Jato. A empresa foi
contratada oficialmente para identificar valores dos investigados em
contas não declaradas no exterior. Mas, ao ter delatores como alvo da
Kroll, caso fossem identificados valores omitidos à Justiça isso poderia
anular os acordos de delação. Dos 12 investigados, apenas três não
fizeram acordos de colaboração.
5. Pedidos de quebra de sigilos de parentes de Youssef
Para a Procuradoria, o pedido apresentado na CPI da Petrobras para a
quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico de parentes do doleiro
Alberto Yousseff, colaborador da Lava Jato, foi também uma forma de
intimidar o delator. O pedido foi apresentado pelo deputado Celso
Pansera (PMDB-RJ), hoje ministro de Ciência e Tecnologia, e envolvia a
ex-mulher, a irmã e as filhas do doleiro. Youssef, em reunião da CPI,
afirmou que Pansera seria um "pau-mandado" de Eduardo Cunha. O doleiro
foi o primeiro colaborador da Lava Jato a indicar a participação de
Cunha no esquema de corrupção.
6. Projeto de lei que restringe delações premiadas
Segundo a Procuradoria, aliado de Cunha apresentou um projeto de lei
que restringe o uso das delações premiadas. O projeto prevê que os
colaboradores não podem corrigir ou acrescentar informações ao acordo de
delação. Foi este o caso na colaboração do lobista Júlio Camargo, que
incriminou Cunha. Camargo procurou a Procuradoria, depois de seus
primeiros depoimentos, para acrescentar informações sobre o deputado.
Cunha determinou que o projeto tenha tramitação conclusiva pelas
comissões de Segurança Pública e Constituição e Justiça. Ou seja, após
aprovado nessas comissões, iria direto ao Senado, sem passar pelo
plenário da Câmara.
7. Demissão de servidor que contrariou o deputado
A procuradoria aponta ainda como uso indevido do cargo pelo
presidente da Câmara a demissão do diretor de informática da Câmara após
reportagem da "Folha de S.Paulo" revelar que os requerimentos contra a
Mitsui foram elaborados por Cunha.
8. Suspeita de receber propina por emendas para bancos e empreiteiras
A ação que pede o afastamento de Cunha do cargo cita também a
suspeita de que o deputado teria recebido propina para apresentar
emendas a projetos de lei favoráveis a bancos em liquidação. Anotação
encontrada com um assessor do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), preso
após pedido do STF, aponta que Cunha teria recebido R$ 45 milhões do
banco BTG em troca de uma emenda que permitiria o uso de créditos de
bancos em liquidação. O BTG seria beneficiado por ter adquirido o
Bamerindus. Cunha diz que a emenda apresentada não abrangia o caso do
Bamerindus. O BTG nega a acusação. A Procuradoria também acusa de Cunha
apresentar emendas que beneficiariam empreiteiras, cujo texto das
emendas era elaborado com participação das próprias empresas.
9. Manobras no Conselho de Ética
As manobras de aliados de Cunha para retardar o andamento do processo
contra o peemedebista no Conselho de Ética também são apontadas pela
Procuradoria para pedir seu afastamento do cargo. A Procuradoria cita a
decisão do 1º vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA) que
afastou o então relator do caso, Fausto Pinato (PRB-SP) e também a
anulação de reunião do conselho no dia 19 de novembro, determinada pelo
2º secretário, Felipe Bornier (PSD-RJ).
10. Ameaças relatadas pelo ex-relator Fausto Pinato (PRB-SP)
As ameaças que o deputado Fausto Pinato (PRB-SP) relatou ter recebido
também foram levadas em conta para pedir o afastamento de Cunha. Pinato
disse ter sido ameaçado após ser nomeado relator do processo contra
Cunha no Conselho de Ética. Na ação, a Procuradoria não apresenta
nenhuma prova de que as ameaças tenham partido de pessoas ligadas a
Cunha, mas afirma que, embora o presidente da Câmara tenha solicitado
proteção a Pinato, o peemedebista seria o "principal beneficiado" pelas
ameaças.
11. Relato de ofertas de propina ao ex-relator no Conselho de Ética
A Procuradoria também usa na ação a entrevista à "Folha de S.Paulo"
na qual Pinato afirma ter recebido ofertas de propina ligadas a seu
relatório no processo contra Cunha no Conselho de Ética. Na entrevista,
Pinato afirma que não deu seguimento às conversas e, portanto, não tem
detalhes sobre os autores do pedido.