O afastamento do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) das funções de
presidente da Câmara dos Deputados, por decisão monocrática do ministro
Teori Zavascki e confirmada ontem mesmo pelo plenário do Supremo
Tribunal Federal, foi comemorado e interpretado por parlamentares
governistas como uma janela aberta para uma possível anulação do
processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Mas se trata apenas de uma mera euforia, um sonho de verão. Uma coisa
não tem nada a ver com outra. Não foi Cunha, sozinho, que aprovou o
impeachment. Foram 367 deputados e o Governo em nenhum momento
questionou judicialmente a decisão soberana da Câmara dos Deputados.
Tudo transcorreu de forma transparente, obedecendo todas as regras em
vigor e seguindo o rito estabelecido pelo Supremo.
A decisão do ministro Teori se sustenta em cima de 11 situações que
comprovariam o uso do cargo pelo deputado para "constranger, intimidar
parlamentares, réus, colaboradores, advogados e agentes públicos com o
objetivo de embaraçar e retardar investigações". Um dos argumentos de
Teori é que a permanência de Cunha à frente da Câmara representaria um
"risco para as investigações penais" pelas quais é acusado no Supremo
Tribunal Federal.
Entre os 11 itens relacionados, portanto, nada com o impeachment. Os
governistas, que não conseguiram convencer com o discurso de golpe,
compreendem a decisão, mas fazem questão de confundir. Sapateiam,
berram, protestam e esperneiam mesmo conscientes de que a derrocada de
Cunha se dá pelo conjunto da sua obra criminal e não política.
O advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo, afirmou que
vai pedir ao STF a anulação do processo de impeachment com base na
saída temporária de Cunha. O jurista e professor de direito
constitucional da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) Marcelo
Figueiredo afirmou que não há impacto nem relação de uma coisa com a
outra, conforme escrevi acima.
"Não existe nenhuma ligação, tanto que o processo já está tramitando
no Senado, independentemente do futuro do deputado Cunha. Em tese, uma
coisa não afeta a outra, mas é claro que o governo vai tentar utilizar
isso como um argumento de defesa, sem chances, entretanto, de
prosperar”, disse Figueiredo.
RISCO ÀS INVESTIGAÇÕES – Para o ministro Teori
Zavascki, que decidiu pelo afastamento de Eduardo Cunha da Presidência
da Câmara, havia "ponderáveis elementos indiciários" a apontar que Cunha
"articulou uma rede de obstrução" às investigações. "Além de
representar risco para as investigações penais sediadas neste Supremo
Tribunal Federal, [a permanência de Cunha] é um pejorativo que conspira
contra a própria dignidade da instituição por ele liderada", escreveu
ele.