quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Para evitar dissidência, Temer tenta domar PSDB



O Globo

Em tentativa de se aproximar do grupo do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que defende internamente um afastamento do PSDB da gestão do Planalto, o presidente Michel Temer se encontrou, ontem, com o tucano, em Mogi das Cruzes (SP).
Temer atua para minar uma dissidência que ameaça tomar corpo com o patrocínio do governador paulista. Alckmin, ao contrário do senador Aécio Neves (MG), que negocia mais espaço no governo Temer, prega um distanciamento, por achar que um eventual fracasso ou mesmo a cassação da chapa Dilma-Temer possa contaminar a disputa pelo Planalto em 2018. Já o presidente teme que as divergências internas no PSDB levem a dificuldades para o governo, principalmente na votação de medidas polêmicas, como a Reforma da Previdência.
Durante a cerimônia de entrega de 420 unidades do Minha Casa Minha Vida, em Mogi das Cruzes, Temer e Alckmin trocaram afagos. O presidente chamou Alckmin de "grande governador e prezado amigo". Já o governador paulista disse que "no Brasil de hoje não há mais espaço do nós contra eles".
A união do partido em torno de Temer sofreu nesta terça-feira novo abalo. Em entrevista à rádio Rede Paraibana de Notícias, o senador licenciado do PSDB e importante aliado de Aécio, Cássio Cunha Lima (PB), admitiu que o presidente da República terá grandes dificuldades para concluir o mandato. Cunha Lima disse que sempre defendeu eleições diretas para resolver a crise política, mas que as ações contra a chapa Dilma-Temer em julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acabaram atropeladas pelo processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
O senador tucano, porém, vê riscos ao mandato de Temer justamente pelas ações que continuam na pauta do TSE. “Existem lá ações cujas acusações são bastante graves. A defesa do presidente da República vai trazer como principal argumento a separação das contas, o que fere um pouco a tradição e a jurisprudência da Justiça Eleitoral. Esperamos que o país consiga atravessar essa fase tão difícil, tão crítica”, disse Cunha Lima.
Questionado sobre um nome para o caso de uma eleição indireta, o senador paraibano descartou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso — “A contribuição dele já foi dada" — e citou que a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, seria uma solução que agradaria a sociedade:
“Ela está na linha sucessória. É uma mulher cuja honestidade e probidade ninguém discute, que tem experiência e poderia cumprir um período de transição”.
Para Cunha Lima, é preciso pensar com abertura sobre um nome para um possível mandato-tampão, devido ao desgaste da classe política. “Quando você olha para os nomes da política partidária tradicional, talvez você tenha dificuldade”, admitiu.
O PSDB tem três ministérios no governo Temer: Cidades, com Bruno Araújo; Relações Exteriores, com José Serra; e Justiça, com Alexandre Moraes, dado como cota de Alckmin. Moraes já passou por momentos delicados no governo e chegou a ser alvo de análise na Comissão de Ética da Presidência, por ter divulgado supostas informações privilegiadas da Operação Lava-Jato, mas foi sempre mantido justamente pela ligação com o governador paulista.
A ponte para o encontro de Temer e Alckmin hoje, em Mogi das Cruzes, foi feita no encontro com deputados tucanos Ricardo Tripoli e Silvio Torres, ontem, no Planalto. O presidente e o governador entregarão juntos casas do Programa Minha Casa, Minha Vida, feitas em parceria com o governo de São Paulo. Sílvio Torres deu uma dica importante ao presidente para se aproximar do tucano. Contou que parte das casas em construção na região só foi viabilizada porque o estado colocou dinheiro, já que os custos de moradia em São Paulo são mais altos do que em outros estados e só o aporte do Minha Casa, Minha Vida era insuficiente.
“Sou secretário-geral do partido, conversamos sobre as dificuldades do país e das votações no Congresso”, disse Torres.
NOMEAÇÃO DE IMBASSAHY SÓ EM 2017
O convite de Temer a Torres e Tripoli ocorreu um dia depois de o peemedebista ter recebido para um café o senador Aécio Neves. O presidente teme que as divergências internas no PSDB criem dificuldades para o governo, principalmente na votação de medidas polêmicas, como a reforma da Previdência.
Trípoli substituirá, a partir de fevereiro de 2017, o atual líder, deputado Antônio Imbassahy (PSDB-BA), que deverá ser o novo ministro da Secretaria de Governo, conforme acertado entre Temer e Aécio há algumas semanas.
A nomeação de Imbassahy só não ocorreu porque os deputados dos partidos do “centrão” se rebelaram pois tinham interesse no cargo. Com isso, Temer deixou a oficialização para 2017, junto a uma minirreforma ministerial para reorganizar as posições dos aliados no governo.
Em outra frente da crise, a entrevista do vice-governador de São Paulo, Márcio França (PSB), ao GLOBO, atacando a recondução de Aécio à presidência do PSDB, inflamou ainda mais os ânimos entre os grupos do senador mineiro e do governador paulista.
A cúpula do PSDB recebeu com ironia as declarações de França, que reagiu às articulações para que um tucano, e não ele, dispute a sucessão de seu aliado Geraldo Alckmin. Os caciques tucanos estão furiosos com as críticas do socialista à recondução de Aécio por mais um ano à presidência do PSDB, mas principalmente com o “ultimato” dado por ele: se o PSDB quiser chegar à Presidência, o candidato tem que ser Alckmin.
Em resposta, dirigentes do PSDB desqualificaram França, tratando-o como uma figura sem expressão local e nacional, que virou um “plantador” de notas para intrigar Alckmin com o partido.
“O melhor serviço que ele (França) pode prestar à candidatura do Geraldo (Alckmin) a presidente da República é dar uma declaração pública de que não é candidato (em 2018) e que apoiará qualquer nome que o PSDB escolher para o governo de São Paulo, e não ficar atacando o PSDB para defender seus interesses”, disse o senador Aloysio Nunes Ferreira, líder do governo no Senado e integrante da Executiva Nacional do PSDB.
Os tucanos dizem que França não é uma força competitiva em São Paulo e nem no governo.
“Ele se julga um grande líder político”, ironizou o vice-presidente do PSDB, o ex-governador Alberto Goldman.
Na entrevista ao GLOBO, França minimizou a força política de Serra, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, além de Goldman e Aloysio. Disse que eles têm prestígio, mas quem tem votos em São Paulo é Alckmin. Afirmou também que o PSB não apoiará outro candidato tucano que não seja o governador paulista. E, por fim, criticou a recondução de Aécio, dizendo que no PSB isso não aconteceria sem uma discussão prévia.
Goldman rebateu o vice-governador paulista, dizendo que a opinião de França é irrelevante e não terá nenhuma influência em uma aliança futura do PSB com o PSDB.
“Isso é passageiro. São arroubos do presidente estadual do PSB, movido por interesses pessoais. No plano nacional, não atrapalha. Ele não quer uma aliança com o PSDB, almeja uma aliança com uma pessoa, que é o governador Geraldo Alckmin. A opinião dele é irrelevante e não terá influência no PSDB, nem tem autoridade ampla para colocar em risco uma aliança futura com o PSB. Não deveria botar o bico nas questões internas do PSDB”.
Dirigentes do PSDB já vêm alimentando um descontentamento com Márcio França há algum tempo. Na eleição municipal em São Paulo, dizem, nomes competitivos do partido foram preteridos para que candidaturas do PSB ocupassem cabeça de chapa, em função de articulações do vice-governador junto a Alckmin.