segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Dilma admite erro sobre a gravidade de crise



Da Folha de S.Paulo
A presidente Dilma Rousseff ensaiou um mea-culpa nesta segunda (24) e admitiu que errou na avaliação da situação econômica durante a campanha eleitoral do ano passado, demorando a perceber a gravidade da crise.
Em entrevista à Folha e a outros dois jornais brasileiros, a petista afirmou que as dificuldades só ficaram mais claras entre os meses de novembro e dezembro de 2014, depois da sua reeleição.
A presidente convidou jornalistas para explicar a reforma administrativaanunciada nesta segunda pelo governo, que promete cortar dez ministérios até setembro.
Admitir erros e cortar na carne são duas das principais cobranças feitas pela oposição e até por aliados desde a corrida presidencial. Dilma não quis falar sobre a crise política que enfrenta, e evitou responder aos críticos e àqueles que defendem seu impeachment ou renúncia.
Apesar da forte turbulência econômica e política, Dilma mostrou-se tranquila, e garantiu estar em fase "budista", mas atacou aqueles que, segundo ela, tentam envolver o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com corrupção e incentivam a intolerância: "É fascista", disse.
REFORMA ADMINISTRATIVA
A presidente previu dificuldades políticas para mexer em redutos ocupados por aliados, mas disse que ninguém será preservado dos cortes, nem mesmo seu partido, o PT. "Vamos passar todos os ministérios a limpo", disse ela.
Em entrevista à Folha em julho, ela classificara como "lorota" a proposta de redução dos ministérios, defendida pela oposição, por não trazer "economia real" aos cofres públicos. Nesta segunda, disse que o objetivo principal não é arrecadar mais.
"Quero tornar eficiente o gasto. E tenho, ao mesmo tempo, de fazer a composição política", disse. Afirmou que tinha "urgências maiores", como o ajuste fiscal, e que, por isso, não tomou a medida antes. "Ninguém consegue brigar em todas as frentes."
CRITÉRIOS
Os objetivos do governo são, segundo ela, "melhorar a gestão, detectar sobreposição de funções e ter mais eficiência". "Senão, fica demagógico." Dilma não quis antecipar quais ministérios serão extintos ou fundidos com outros.
"Não posso dizer quem é que está marcado para morrer porque não tenho certeza, primeiro, se vai morrer", disse. Questionada se o PT seria preservado, disse: "Óbvio que não, querida. Não é por partido. O critério não pode ser o PT será preservado e todos os outros... Não será isso."
CORRUPÇÃO
A presidente foi questionada se, em algum momento, imaginou que militantes do PT estivessem envolvidos no esquema de corrupção descoberto na Petrobras. "Não", disse. Quando um dos jornalistas quis saber se tinha sido "completamente surpreendida", respondeu: "Fui. Acho, e lamento profundamente".
Dilma não quis tecer comentários sobre o juiz Sergio Moro. "Minha querida, me desculpa, se você me perguntar de qualquer pessoa, não vou dar opinião". Ela disse que "ninguém pode interromper esse processo [de apuração]". Reconheceu, porém, que "as investigações, quanto mais rápidas e mais efetivas, melhor".
SAÍDA
Dilma não quis responder sobre os pedidos de impeachment, feitos pela oposição, ou sua renúncia, sugerida pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. "Não vou falar", afirmou. "Não é fácil, né? Não é uma sugestão fácil."
ECONOMIA
"Nos preocupamos imensamente com duas coisas. Primeiro é a queda no emprego. Segundo é a inflação", disse, afirmando que o efeito da desaceleração da China afetará o mundo todo. "Você terá um efeito China bastante acelerado. Todo mundo pensa que é só commodities. Não é só."
MAROLA OU TSUNAMI?
"Até eu voltar [da reunião] dos BRICS [em julho], estava achando que era superável. Só não contava com essa queda sistemática. Estava achando que era superável por tudo que eu sabia. Ia ter dificuldade, mas não ia ter uma situação muito difícil. A partir de hoje, não sei. Ninguém sabe."
LEVY
A presidente mostrou-se chocada com rumores espalhados no mercado financeiro nesta segunda de que seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy, estaria de saída do cargo pelo fato de ter viajado para os Estados Unidos inicialmente sem compromissos oficiais. "Isso é mentira. Ele foi ver a menina dele [filha], que vai morar na China", afirmou.
ERRO
"Fico pensando o que é que podia ser que eu errei. Em ter demorado tanto para perceber que a situação podia ser mais grave do que imaginávamos. E, portanto, talvez, nós tivéssemos de ter começado a fazer uma inflexão antes", reconheceu, afirmando que não dava para ter dimensão da crise em agosto do ano passado, durante a campanha eleitoral.
"Talvez porque não tinha indício de uma coisa dessa envergadura. A gente vê pelos dados", justificou. "Nós levamos muito susto. Nós não imaginávamos. Primeiro que teria uma queda da arrecadação tão profunda. Ninguém imaginava". Para a presidente, a crise só ficou evidente entre novembro e dezembro.
LULA
Dilma defendeu o ex-presidente Lula, seu antecessor e padrinho político. "Não acho correto o que fazem com ele. Quero manifestar em alto e bom som que não concordo", disse. "Acho que tentam diminuí-lo, que tentam envolvê-lo. Não acredito que em algum momento no futuro dê certo. Eu acho que é uma coisa triste de ver isso sendo feito. Passam de todos os limites."
Em seguida, sem citar nomes ou partidos, disse que a oposição incentiva sentimento de "intolerância inadmissível". "De repente você começa a ver que isso é cultivado, incentivado. A intolerância é a pior coisa que pode acontecer numa sociedade, porque cria um 'nós e o eles'. O 'nós' tem direito a tudo, e o 'eles', a nada. Isso é a característica principal do dualismo, fascista. É um desserviço ao país."
EDUARDO CUNHA
Questionada sobre o que sentia em relação ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou: "Estou ficando budista, viu?"