'Tenho medo do mundo lá fora', diz mulher internada por vício em internet
Lucélia, de 26 anos, está há seis meses em clínica de Araçoiaba da Serra.
Proximidade do término do tratamento, daqui 2 meses, assusta a paciente.
Lucélia tem medo de não conseguir superar o vício
em internet (Foto: Natália de Oliveira/G1)
em internet (Foto: Natália de Oliveira/G1)
Já se passaram seis meses desde que Lucélia Cristina Paes, de 26 anos,
iniciou o tratamento contra o vício em internet em uma clínica de
Araçoiaba da Serra (SP). A doença, que a fez perder o emprego, o marido e 33 quilos
- por deixar de viver a vida real para se dedicar exclusivamente a
online -, ainda não está totalmente controlada e, por isso, a
proximidade do término do tratamento, prevista para daqui dois meses,
assusta a paciente. "Tenho medo do mundo lá fora, de como vai ser fora
daqui, pois não quero mais voltar a ter a vida que eu tinha antes",
conta a jovem.
Antes da internação, Lucélia havia trocado o dia pela noite e até
esquecia de comer. Ela trabalhava pensando na hora do intervalo, em que
poderia pegar o celular que ficava guardado no armário da empresa. Como o
tempo livre não era suficiente, Lucélia saiu do emprego para se dedicar
única e exclusivamente ao vício eletrônico. Já o marido, cansado de
"disputar" a atenção dela com a internet e de sentir ciúmes com as
conversas dela em salas de bate-papo – que geraram várias brigas –
acabou pedindo o divórcio.
Como parte do tratamento Lucélia iniciou há alguns dias a etapa de
ressocialização, quando o paciente da clínica retorna à sua casa por um
pequeno período na tentativa de voltar a se acostumar com o ambiente e,
também, com o convívio familiar. A jovem ficou por cinco dias em casa,
tempo que considerou insuficiente para saber se irá, de fato, conseguir
superar o seu vício. "O computador estava lá, na minha frente, em nenhum
momento usei. Só que, quando penso em sair de vez da clínica sinto medo
de sair e depois ter que voltar".
Minha filha, de seis anos, ficou me vigiando quando fui pra casa e me pediu para não entrar mais na internet"
diz, Lucélia
Durante os cinco dias que permaneceu em casa, que fica na cidade de
Tatuí (SP), a paciente contou com o apoio da família para se manter
longe da vida online. Principalmente da filha, de seis anos, que, apesar
da pouca idade, ficou no pé da mãe o tempo todo para que ela não
tivesse uma recaída. "Ela ficava falando pra mim: 'mãe, não entra na
internet mais. Não chega mais perto do computador'. Até na hora que ela
quis tirar uma foto comigo, não pegou o celular. Disse que era melhor
usarmos a máquina fotográfica mesmo", relembra Lucélia.
Após a visita, a primeira desde a internação, a paciente admite que
teve um choque de realidade, da vida que tem dentro da clínica, onde
tudo é regrado e o acesso a vida online não depende dela, e da que terá
depois do término do tratamento, quando só dependerá dela para ficar
longe da tecnologia. Por conta disso, ela se preocupa e se questiona,
muito, se conseguirá ter o autocontrole necessário para se manter longe
do vício que destruiu, momentaneamente, a sua vida.
Andamento do tratamento
De acordo com a psicológa responsável pelo tratamento, Ana Leda Bella, a recuperação de Lucélia é diferente de um paciente viciado em drogas, já que ela não irá conseguir, depois que sair da clínica, ficar totalmente longe do uso de tecnologias. "Para ela é muito mais difícil do que um usuário de entorpecentes, ela vai ter que saber usar, colocar limites. Não poderá usar como lazer a internet, apenas, se for o caso, como ferramenta de trabalho", explica.
De acordo com a psicológa responsável pelo tratamento, Ana Leda Bella, a recuperação de Lucélia é diferente de um paciente viciado em drogas, já que ela não irá conseguir, depois que sair da clínica, ficar totalmente longe do uso de tecnologias. "Para ela é muito mais difícil do que um usuário de entorpecentes, ela vai ter que saber usar, colocar limites. Não poderá usar como lazer a internet, apenas, se for o caso, como ferramenta de trabalho", explica.
saiba mais
Ana ainda acrescenta que a dependência de Lucélia na internet se deu ao
fato dela ser uma pessoa muito carente e ansiosa, que buscava a vida
online para poder ter algo para dominar, diferentemente do que ocorria
na sua vida pessoal. "Essa dependência foi para buscar algo novo, para
se sentir bem, já que ela usava, basicamente, a internet para se
relacionar com as pessoas, seja amorosamente ou para aumentar o círculo
de amizades que tinha".
Daqui a duas semanas, a paciente deve voltar para casa, mas, dessa vez,
ficará fora da clínica por sete dias. Porém, terá que seguir todos os
procedimentos estipulados dentro do seu tratamento, como, o mais obvio,
não ter usar nenhum tipo de equipamento com acesso a internet e não
ficar sozinha em nenhum momento. "Se a Lucélia completar todas as etapas
corretamente, daqui dois meses ela encerra o tratamento. Mas, caso isso
não ocorra, ela poderá ficar mais tempo com a gente", finaliza a
psicológa.
Para se manter longe da internet, Lucélia conta com o apoio de psicológas (Foto: Natália de Oliveira/G1)